23 de abril de 2013

Puto



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Houveram tempos em que liderava o mais pequeno.
Liderava o puto. Liderava nas ideias, era o líder no sorriso matreiro, prudente convencia de tão curioso que era o seu desejo de experiência.
Era o tempo em que nada era mais importante que fugir pela janela para estarmos juntos e inventar do nada formas de brincar a crescer sem tempo. Saltar quintais, assaltar todos os passeios aos chutos na bola, patins, chinchada, construção das espadas mais duras do reino, socos e pedrada porque sim ou abraços e beijos porque não, as danças nas escadas, as espreitas das mulheres no duche da doce fábrica, os truques malabaristas em troca de escudos para doce, os comícios de todas as cores que afinal eram uma só, os dialectos inventados para complementar o diálogo, os silêncios dos gatos, as fugas para banhos nos lagos de um campo que parecia tão grande, as sestas obrigadas, e as caretas maradas e o olhar cúmplice de aprendizagem perante adversidades adultas que para nós os putos era nada.
Depois crescemos e sempre juntos separamos-nos, seguimos sonhos, mulheres, profissões e as aventuras com que sonhava-mos nos filmes que nos foram dando. Ai foste único, pioneiro. E sozinho correste atrás de provas que tinhas de dar e sem o saber nunca perdeste a inocência. Como se nunca tivesses crescido, procuras-te o espaço que te foi negado. E como tentaste, e como erraste. E continuaste até não dar.
Deram-te um filho, semeaste, como semeava esperança o olhar de puto que nunca te largou.
Desejava acreditar que nada do que fizeste foi em vão. Gostava de sentir que o  sofrimento á tua volta é agora uma tranquilidade. Sei que agora és livre de ser o puto que nunca te abandonou.
Choro o reconhecimento da ausência de um adeus onde não posso estar, mas também a alegria de te saber finalmente livre. Livre!
Não esquecendo a infância não te posso esquecer, porque foste tu o meu primeiro amigo.
Desculpa-me não estar por perto mas estou contigo no coração.
Voa alto meu Amigo, corre com o vento na serenidade que nunca te abraçou.

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ESte post é dedicado á Dona Laura e ao Bernardo.

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